21/03/2019

Dia Mundial da Poesia ( 21 de março 2019) | POESIA LIVRE


As Bibliotecas Escolares AETP, associando-se ao evento “Poesia Livre” de Santo Tirso, convidam toda a comunidade educativa a fruírem alguns poemas da Antologia organizada por  António Sousa e Manuela Dinis. 
Neste  dia Mundial da Poesia, celebrem com alegria e entusiasmo a Poesia! 




Olha, Marília, as flautas dos pastores 

Olha, Marília, as flautas dos pastores 
Que bem que soam, como estão cadentes! 
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes 
Os Zéfiros brincar por entre flores? 

Vê como ali beijando-se os Amores 
Incitam nossos ósculos ardentes! 
Ei-las de planta em planta as inocentes, 
As vagas borboletas de mil cores. 

Naquele arbusto o rouxinol suspira, 
Ora nas folgas a abelhinha para, 
Ora nos ares sussurrando gira: 

Que alegre campo! Que a manhã tão clara! 
Mas ah! Tudo o que vês, se não te vira 
Mais tristeza que a morte me causara. 


                                                      Bocage, in ‘Líricas e Sátiras’ 



 PASTORAL

Não há, não,
duas folhas iguais em toda a criação.
Ou nervura a menos, ou célula a mais,
não há, de certeza, duas folhas iguais.
Limbo todas têm,
que é próprio das folhas;
pecíolo algumas;
bainha nem todas.
Umas são fendidas,
crenadas, lobadas,
inteiras, partidas,
singelas, dobradas.
Outras acerosas,
redondas, agudas,
macias, viscosas,
fibrosas, carnudas.
Nas formas presentes,
nos actos distantes,
mesmo semelhantes
são sempre diferentes.
Umas vão e caem no charco cinzento,
e lançam apelos nas ondas que fazem;
outras vão e jazem
sem mais movimento.
Mas outras não jazem,
nem caem, nem gritam,
apenas volitam
nas dobras do vento.
É dessas que eu sou.

                                               António Gedeão, in ‘Obra Completa’


Os Paraísos Artificiais 

Na minha terra, não há terra, há ruas;  
mesmo as colinas são de prédios altos 
com renda muito mais alta.  
Na minha terra, não há árvores nem flores.  
As flores, tão escassas, dos jardins mudam ao mês,  
e a Câmara tem máquinas especialíssimas  
para desenraizar as árvores 

O cântico das aves — não há cânticos, 
mas só canários de 3º andar e papagaios de 5º. 
E a música do vento é frio nos pardieiros. 

Na minha terra, porém, não há pardieiros,  
que são todos na Pérsia ou na China,  
ou em países inefáveis. 

A minha terra não é inefável.  
A vida na minha terra é que é inefável.  
Inefável é o que não pode ser dito. 

    Jorge de Sena, in ‘Pedra Filosofal’ 

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